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Boas Práticas - Comarca de Fartura - Improbidade

Boas Práticas - Comarca de Fartura - Improbidade

por Administrador - -
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Aos estimados Colegas em Estágio Probatório, trazemos mais uma excelente iniciativa, da lavra da Doutora Manuela, da Comarca de Fartura.

Compartilho com os colegas resumo da ação civil pública por ato de improbidade administrativa promovida em face do atual e do anterior prefeito do Município de Fartura, por meio da qual o Ministério Público obteve ordem liminar de bloqueio dos bens dos réus.
A partir de inquérito civil e pedido de quebra de sigilo de movimentações e dados bancários foi desvendado um esquema de agiotagem com o dinheiro público, feito pelos altos mandatários do município.

Dificuldades na preparação da ação e construção da solução:

Resumo dos fatos.

A Prefeitura Municipal, autorizada por lei municipal, repassava mensalmente a uma associação de estudantes verbas para subsidiar o transporte dos estudantes para outros municípios. Os repasses passaram a ser feitos por meio de cheques nominais a associação. Valendo-se desse expediente- já irregular -, o então prefeito, na qualidade de titular da unidade orçamentária, determinou a emissão de cheques pós-datados e orientou os estudantes a resgatarem os títulos antecipadamente com o então vice-prefeito e chefe de gabinete, mediante o pagamento de taxa de juros. É dizer: a entidade estudantil recebia o repasse de verbas por meio de cheque nominal para ser sacado em data futura. Em seguida, entregava o cheque ao vice-prefeito em troca de dinheiro. O vice-prefeito calculava sobre o valor do cheque a taxa de juros que aplicaria para desconto do título e abatia essa taxa do valor total do cheque. Então, pagava em dinheiro aos estudantes e recebia o título com endosso em branco. O título era usado para retroalimentar o esquema ímprobo e possibilitar aos réus a realização de saques em dinheiro das contas correntes da Municipalidade.

Estratégia de encerramento da investigação.

Desde que esses acontecimentos e enquanto o Ministério Público investigava os fatos, o prefeito agiota concluiu o mandato e elegeu seu vice como sucessor, que já está para concluir o mandato. Nas pequenas cidades do interior, os atos de improbidade reproduzem-se como planárias. Cada ato gera diversos outros, pois os agentes públicos são despreparados para as funções ou governados apenas por seus interesses privados e desvalores. Talvez por essas razões, vão surgindo nos inquéritos civis diversos atos irregulares em meio à investigação. O dilema: investigar eternamente ou promover ação? Para essa decisão foi fundamental lembrar de reflexões feitas em palestra sobre técnicas de investigação, dada durante o Curso de Adaptação, sobretudo a aplicação do método de delimitação do sítio arqueológico, enfatizado por um dos palestrantes

Optei por promover a ação, pois lá estavam na investigação todos os elementos para configurar as três modalidades de ato de improbidade. Se investigasse mais, seria possível constatar outras irregularidades, que, entretanto, não alterariam a consequência definitiva.

Afastamento cautelar do prefeito atual.

Não incluí esse pedido porque os fatos começaram a ser investigados em 2008. Não será necessário ouvir na instrução funcionários com subordinação ao prefeito. Avaliei que não havia risco para a produção da prova, inclusive diante dos documentos bancários já obtidos no pedido do quebra.

Bloqueio de bens e valor da causa.

Optei por pedir primeiro o bloqueio de bens em nome do prefeito e vice. Caso insuficientes os bens, promoverei ação autônoma para anular a compra de imóvel feita pelo prefeito em nome dos filhos com o dinheiro obtido na agiotagem (ele pagou o imóvel com cheque da prefeitura). Se incluísse o imóvel dos filhos no pedido, os próprios filhos teriam que ser incluídos no polo passivo e isso dificultaria o trâmite da ação, sendo um prato cheio para anular a decisão que autorizou o bloqueio. Contei com valiosa ajuda dos colegas do CAO para construir essa solução e para cálculo do valor da causa, incluindo a multa civil.

Após distribuir a ação, despachei o pedido com o juiz, explicando detalhadamente as razões do Ministério Público.

Representação por crime.

Como neste caso os atos de improbidade também têm repercussão na esfera penal, providenciei cópia integral dos autos e estou preparando a representação à Procuradoria Geral de Justiça para investigação/denúncia do prefeito.

Relação com a imprensa.

A ação foi distribuída em meio ao processo eleitoral. Optei por não divulgar na imprensa a obtenção da ordem de bloqueio de bens dada pelo juiz. O próprio juiz orientou seus funcionários para cautela quanto à divulgação de dados. A preocupação era evitar acusações de que estaríamos manipulando o processo eleitoral. Embora o Ministério Público não tenha divulgado a ação, a imprensa obteve a informação e publicou matéria no jornal, garantindo a informação à população.

Conclusão.

Por conta da ação do Ministério Público, o prefeito atual está com todo o patrimônio (“declarado”) bloqueado e estamos aguardando resposta quanto ao bloqueio de imóveis do prefeito anterior.

Na semana seguinte à efetivação da ordem de bloqueio dos bens, participei de audiência com o prefeito anterior.

No mais, redobrei os cuidados ao sair tarde da Promotoria.

Se não for o Ministério Público, quem vai por o guizo no pescoço do gato?